ÍNDICE DE RECUPERAÇÃO DA FREQUÊNCIA CARDÍACA (IRFC), UMA PROPOSTA DE TESTE.
- Borelli
- 2 de nov. de 2023
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Nas duas últimas postagens foi explanado tudo sobre o SAGAT (Specific Aerobic Gymnast Anaerobic Test), também conhecido por Teste de Borelli, desde sua origem, aplicação prática e a utilização dos dados para avaliação, comparação e controle do rendimento e da carga de treino.
O SAGAT é um teste validado cientificamente tendo como principal objetivo aferir a condição física específica do ginasta relacionada com a demanda energética determinante da coreografia (via glicolítica) sem que o mesmo tenha a necessidade de realizar sua rotina competitiva.
Para essa publicação atual abordaremos uma proposta de teste onde será utilizada uma ferramenta básica e simples conhecida por frequência cardíaca (FC) e que poderá fornecer dados importantes relacionados com as adaptações ao treinamento, tanto de forma aguda quanto crônica.
De acordo com a vasta literatura científica sobre o tema frequência cardíaca e exercício físico temos várias evidências apontando uma correlação positiva entre o tempo de recuperação da FC e o desempenho esportivo, e em função disso será apresentado um teste específico para a Ginástica Aeróbica aplicado desde 2010, conhecido por Índice de Recuperação da Frequência Cardíaca (IRFC).
Essa avaliação utiliza como parâmetro os passos básicos da modalidade e a recuperação da frequência cardíaca como indicador de adaptação a carga de treinamento aplicada.
FREQUÊNCIA CARDÍACA E EXERCÍCIO FÍSICO
De acordo com Santana et al,2020 ( A influência da idade sobre a magnitude de recuperação da frequência cardíaca em indivíduos treinados) ao iniciarmos uma atividade física qualquer, um dos efeitos mais imediatos sobre o sistema cardiovascular é o aumento da frequência cardíaca ocasionado pela alteração no balanço dos componentes simpático e parassimpático que controlam o sistema cardiovascular agindo com a liberação de neurotransmissores que podem aumentar ou diminuir a FC.
No artigo de revisão Efeitos do treinamento aeróbico sobre a freqüência cardíaca (Almeida e Araújo,2003) os autores citam que a FC é controlada primariamente pela atividade direta do sistema nervoso autônomo (SNA), através de seus ramos simpático e parassimpático sobre a auto-ritmicidade do nódulo sinusal, com predominância da atividade vagal (parassimpática) em repouso, que é progressivamente inibida com o exercício, e simpática quando do posterior incremento da intensidade do esforço conforme demonstrado na figura 1.

Segundo as afirmações de Dallazen e Tiggemann, 2021 (Comportamento da frequência cardíaca de recuperação em diferentes intensidades de exercícios aeróbios) logo nos primeiros segundos do exercício aeróbio, o aumento da FC dá-se pela inibição da atividade vagal, que aumenta a contratilidade dos átrios elevando também a velocidade do nódulo atrioventricular (AV), independente da intensidade do exercício, bem como do nível de condicionamento do sujeito.
Imediatamente após a fase inicial do exercício, a frequência cardíaca aumenta novamente pela elevação da concentração sanguínea de norepinefrina (também denominada de noradrenalina, uma catecolamina endógena que medeia diversos efeitos fisiológicos ao atuar como hormônio/neurotransmissor adrenérgico), distensão mecânica do átrio, e consequentemente, do nódulo sinusal, em função do maior retorno venoso ou pela exacerbação da estimulação adrenérgica no nódulo sinusal, bem como pelo aumento da temperatura corporal e da acidez sanguínea.
Ao final da atividade física, a função autonômica cardíaca retorna gradualmente às condições de repouso e a FC reduz.
Os artigos Recuperação autonômica cardíaca pós-exercício: Revisão dos mecanismos autonômicos envolvidos e relevância clínica e desportiva ( Lima et al,2012) e A influência da idade sobre a magnitude de recuperação da frequência cardíaca em indivíduos treinados (Santana et al,2020) os autores aprofundam um pouco mais sobre a recuperação da FC após o exercício físico.
Relatam que logo após o término do esforço a frequência cardíaca cai de maneira (mono) exponencial, diminuindo progressivamente o débito cardíaco até o seu nível de repouso.
Como já visto anteriormente, a queda da FC pós-exercício é controlada pelo sistema nervoso autônomo, por meio da soma integrada de reativação do tônus vagal e retirada do tônus simpático e por conta disso, o estudo da recuperação da frequência cardíaca permite verificar a capacidade de recuperação autonômica cardíaca pós-exercício.
Conforme o ritmo de queda da FC e de seus determinantes autonômicos, a recuperação autonômica cardíaca pode ser dividida em duas fases distintas:
1- Fase Rápida da Recuperação Autonômica Cardíaca = Imediatamente após o término do exercício físico a frequência cardíaca cai de maneira significativa e imediata (figura 2) sendo então a recuperação da FC, medida nos primeiros instantes pós-exercício, uma forma eficiente de avaliação da reativação vagal cardíaca.
Essa fase tem duração de 60-120 segundos.
2- Fase Lenta da Recuperação Autonômica Cardíaca = compreende todo o período de tempo logo após a fase rápida até que os valores da FC atinjam seus níveis de repouso.
No decorrer desta fase ocorre a remoção dos metabólitos produzidos pela contração muscular (lactato, H+, Pi...) e das catecolaminas circulantes, além do retorno do pH sanguíneo à sua condição basal e normalização da temperatura corporal.
A regularização desses fatores viabilizam a diminuição da ação de quimiorreceptores, de metaborreceptores musculares e de termorreceptores sendo que tais respostas produzem queda lenta e sustentada da FC, mediada pela soma integrada de reativação parassimpática e retirada simpática sobre o coração. (figura 2)

FREQUÊNCIA CARDÍACA DE RECUPERAÇÃO E DESEMPENHO ESPORTIVO
Na publicação Recuperação autonômica cardíaca pós-exercício: Revisão dos mecanismos autonômicos envolvidos e relevância clínica e desportiva ( Lima et al,2012) os autores explanam que a recuperação da FC também tem uma aplicação importante no meio desportivo.
Eles relatam que investigações científicas têm demonstrado atletas apresentando uma maior recuperação da frequência cardíaca à um mesmo esforço quando comparados a indivíduos com níveis moderados de atividades físicas ou sedentários, além de relacionar que uma boa recuperação da FC pode ser o fator predisponente ao sucesso desportivo, já que o bom desempenho em uma atividade ou sessão desportiva requer uma ótima recuperação dos esforços das atividades ou sessões anteriores.
De acordo com diversas evidências científicas já publicadas, os altos níveis de condicionamento levam a melhores índices de recuperação da frequência cardíaca.
Numerosos estudos foram conduzidos com atletas de diferentes idades e modalidades esportivas, observando os valores para este índice de mensuração da função autonômica.
Dentro desse raciocínio, Ostojic e Calleja-Gonzalez,2010 (Aerobic capacity and ultra short-term heart rate recovery after maximal exercise in sportswomen) e Ostojic et al,2011 (Ultra short-term heart rate recovery after maximal exercise: relations to aerobic power in sportsmen) atentam que atletas com maior aptidão aeróbia possuem uma melhor recuperação da frequência cardíaca após o esforço máximo, fato esse fundamental no planejamento e preparação de atletas de alto rendimento competitivo na Ginástica Aeróbica.
Mercedes et al,2005 (A longitudinal study of physical activity and heart rate recovery: CARDIA, 1987-1993) relatam que o treinamento físico regular aprimora a recuperação da frequência cardíaca corroborando com a investigação de Yamamoto et al,2001 (Effects of endurance training on resting and post-exercise cardiac autonomic control) que reiteram a existência da melhora na recuperação da FC após um programa de treinamento aeróbico de alta intensidade (80% do VO2máx) e que esse progresso já se mostra evidente com 1 semana de treinamento físico, indicando que as adaptações autonômicas relacionadas à recuperação da frequência cardíaca são rapidamente promovidas pelo treinamento físico.
Platonov, 2001 em sua obra clássica Teoría general del entrenamiento deportivo olímpico correlaciona a frequência cardíaca e seu tempo de recuperação entre atletas de alto rendimento na luta livre durante e depois de efetuarem um protocolo padrão (lançamento de boneco de treino durante 3 minutos com um ritmo de 10 lançamentos em 1 minuto) em 3 etapas distintas na periodização dos lutadores:
1- 1° etapa do período preparatório (*)
2- 2° etapa do período preparatório (*)
3- Período competitivo (*)

Pode-se observar através da figura 3 que existe uma diferença significativa no decorrer de cada etapa, onde se torna evidente que quanto mais treinado estiver o atleta mais rápida será a recuperação da frequência cardíaca, indicando desta maneira uma adaptação positiva relacionando o treinamento realizado e o aumento do desempenho.
Rosário, 2007 (Análise da variabilidade da frequência cardíaca em nadadores de elevado rendimento competitivo numa época desportiva) enfatiza os conceitos de Maglischo (2003) envolvendo a natação de alta performance, onde ele considera que o tempo no qual a frequência cardíaca dos atletas demora a regressar a valores normais de repouso após o exercício, é um excelente método de medida da adaptação dos indivíduos ao treino.
Segundo Maglischo, um rápido tempo de recuperação e estabilização da frequência cardíaca após o exercício indica um bom incremento da condição física, nomeadamente da sua capacidade aeróbia.
Caso contrário, ou seja, num elevado tempo de recuperação e estabilização da frequência cardíaca de repouso, pode-se supor que existam falhas na adaptação ao treino ou a existência de doenças.
Na publicação A influência do controle autonômico na recuperação da frequência cardíaca pós-esforço de militares do exército brasileiro (Duarte et al,2007) são citados alguns estudos, como o de Bucheit et al,2006 (Cardiac parasympathetic regulation:respective associations with cardiorespiratory fitness and training load) que propõe uma associação positiva entre o condicionamento físico e a regulação vagal.
Nesse estudo 2 grupos foram comparados, um com melhor condicionamento físico (GEV) com o de pior condição (GBV) e ficou evidenciado que quanto melhor o condicionamento, maior o controle vagal das respostas cardiovasculares e a partir dessas conclusões, pode-se supor então, que uma melhor aptidão física levaria a uma desaceleração mais rápida da FC pós-esforço. (figura 4)

Trevizani et al,2012 ( Effects of Age and Aerobic Fitness on Heart Rate Recovery in Adult Men) indicam que a frequência cardíaca de recuperação, no presente trabalho, foi menor nos indivíduos de meia-idade com aptidão aeróbica deficitária, em comparação aos voluntários de aptidão aeróbica boa.
Nesse mesmo paper os resultados ratificam os achados de Cole et al,2000 (Heart rate recovery after submaximal exercise testing as a predictor of mortality in a cardiovascularly healthy cohort.)e os de Du et al,2005 (Heart rate recovery after exercise and neural regulation of heart rate variability in 30-40 year old female marathon runners), sendo que no primeiro os autores evidenciaram uma relação entre baixos valores da frequência cardíaca de recuperação no grupo com pior aptidão aeróbica e no segundo, estudando mulheres maratonistas (32 a 42 anos), descobriram que a recuperação da frequência cardíaca foi mais rápida em maratonistas do que no grupo controle sedentário.
Na publicação Frequência cardíaca de recuperação como índice de aptidão aeróbica (Fernandes et al,2005) os autores apresentam um estudo no qual o objetivo foi
verificar a relação entre a frequência cardíaca de recuperação (FCREC) com a WMAX ( maior carga obtida no protocolo do teste de esforço realizado) e com a carga indicadora de LTM2 (segundo limiar de transição metabólica) obtida em teste progressivo no cicloergômetro.
Na fase de recuperação foi analisada a FCREC no primeiro, terceiro e quinto minutos através de uma fórmula matemática com o intuito de encontrar os percentuais de queda da frequência cardíaca pós-exercício até o momento elegido para a verificação da mesma. (figura 5)

De acordo com os resultados obtidos os índices relativos e absolutos da FCREC apresentaram-se como bons preditores do desempenho aeróbio durante o teste progressivo.
As associações entre WLTM2 e WMAX e percentual de queda em três e cinco minutos sugeriram que a baixa atividade simpática na FCREC (fase lenta da recuperação) indica ser uma característica dos indivíduos com alto nível aeróbio, e em conjunto com os dados do presente estudo podem sugerir que modificações na aptidão aeróbia não são determinantes no controle da fase rápida da queda da FC.
Deve-se levar em conta também que o consumo de oxigênio após exercício (EPOC) pode ter valor especulativo na cinética da FCREC, pois Bernard et al, 1997 ( Relationships between oxygen consumption and heart rate in transitory and steady states of exercise and during recovery: influence of type of exercise) verificaram que o EPOC apresentava associações com a FCREC apenas na fase lenta, entretanto, estudos futuros são necessários para clarificar a influência da aptidão aeróbia na regulação autonômico da FCREC.
Por outro lado Bezerra, 2007 (Frequência cardíaca e exercício : Uma interpretação baseada em evidências) explana, através das afirmações de Ricardo et al,2011 (Initial and final exercise heart rate transients: influence of gender, aerobic fitness and clinical status ) que a recuperação da FC tem baixa associação com o consumo máximo de oxigênio.
Desta forma, o autor alerta que a utilização da estratégia utilizando a FCREC como indicador de melhora do condicionamento só deve ser utilizada para comparar efeitos do treinamento para uma mesma pessoa, mas não comparar indivíduos diferentes para ver quem tem maior consumo de oxigênio em função da recuperação mais rápida da FC.
ÍNDICE DE RECUPERAÇÃO DA FREQUÊNCIA CARDÍACA (IRFC) : UMA PROPOSTA DE TESTE ESPECÍFICO PARA A AVALIAÇÃO DA ADAPTAÇÃO AO TREINAMENTO NA GINÁSTICA AERÓBICA
A ideia principal deste teste é avaliar tanto a condição técnica quanto a física do ginasta.
Quando ele foi criado em 2010 duas vertentes foram devidamente elaboradas: a primeira com o intuito de avaliar o atleta tecnicamente através dos passos básicos da modalidade (figura 6) em uma sequência padronizada dentro de uma música com o ritmo, tempo de duração e velocidade utilizada nas coreografias competitivas.

Inicialmente a duração do teste era de 1 minuto e 50 segundos pois correspondia ao tempo da coreografia da época e atualmente é realizado em 1 minuto e 25 segundos. (tempo oficial da coreografia determinado pelo regulamento no ciclo 2022-2024).
Essa parte do IRFC foi desenvolvida pela técnica/coreógrafa da equipe de Ginástica Aeróbica Esportiva da Sociedade Esportiva Palmeiras, Claudia Gomes.
A avaliação técnica do teste é realizada sempre com a mesma música, bpm, ritmo sequência e que consiste na execução correta dos passos básicos com intenso saltitamento dentro de um espaço quadrado de 0,90 x 0,90 cm, aliado ao alinhamento corporal da cabeça, tronco e membros com aplicação de força constante durante o decorrer de todo o esforço.
Finalizado o procedimento uma nota de 0 a 10 será gerada de acordo com critérios técnicos, os quais não serão explorados nessa postagem pois o foco deste post é voltado exclusivamente aos aspectos relacionados com o condicionamento físico.
O vídeo abaixo mostra a execução completa do teste.
Como o conteúdo desse blog é direcionado prioritariamente à preparação física específica da modalidade abordaremos, de forma detalhada, a segunda vertente do teste relacionada a temática do condicionamento físico.
De acordo com o que foi visto na introdução dessa postagem (através da apresentação de diversas evidências científicas) ficou nítido que a frequência cardíaca de recuperação (FCREC) é uma ferramenta sólida para a verificação na evolução na condição física do ginasta.
A proposta, relacionada com o conteúdo da parte física do teste, consiste na mensuração da frequência cardíaca em 2 momentos distintos:
1- 10 segundos após a finalização do teste
2- 3 minutos após a finalização do teste
O procedimento é bastante simples, 10”após a finalização do teste o ginasta, ainda em pé, terá sua FC aferida pelo avaliador e em seguida deverá sentar e permanecer nessa posição até o tempo de 2’45”, ficando novamente em pé e aguardando quando o cronômetro indicar 3’ para uma nova tomada da frequência cardíaca.(figura 7)
O avaliador necessitará anotar o número de batimentos nos 2 momentos selecionados pois os dados deverão ser inclusos na planilha para o cálculo do percentual de recuperação da frequência cardíaca entre a aferição da FC nos 10” após o teste e no terceiro minuto pós avaliação.
Para isso basta colocar os valores nas células em vermelho da planilha (figura 8)
disponibilizada no final dessa publicação.

A fórmula para o cálculo do percentual de recuperação da frequência cardíaca foi a utilizada no já citado artigo acima de Fernandes et al,2005 (Frequência cardíaca de recuperação como índice de aptidão aeróbica ) adaptado ao tempo de recuperação proposto (3’) pelo IRFC baseado em algumas das evidências já descritas no decorrer do texto acima.
% FCREC (IRFC) = FC pós 10” – FC pós 3’
_________________________
FC pós 10”
TENDÊNCIA DAS VARIÁVEIS DO IRFC (FC pós 10”, FC pós 3’ e % FCREC) NO PERÍODO DE 2010 A 2023
Quando temos um teste aplicado de forma sistematizada por mais de uma década (no caso desse estudo, 14 anos sendo que em 2020 e 2021 não foi realizado em função do afastamento dos treinamentos por causa da pandemia) certamente poderemos observar uma propensão do que ocorre com as variáveis através da análise dos dados.
Nesse longo período de tempo de aplicação do IRFC, com centenas de avaliações realizadas em diferentes ginastas, podemos observar uma situação bastante interessante conforme apresentado nas figuras 9,10,11,12,13 e 14.






É possível observar que as 3 variáveis estudadas tiveram exatamente a mesma tendência no decorrer das temporadas, ou seja, em todos os anos a frequência cardíaca (10 segundos e 3 minutos após a avaliação) apresentou queda no número de batimentos do início para o final da preparação e o percentual da recuperação da frequência cardíaca mostrou aumento nesse mesmo período.
A figura 15 mostra a média dos dados referentes ao período de 2010 à 2023.

Esses resultados demonstram, de acordo com o embasamento apresentado na parte inicial dessa postagem, as seguintes conclusões:
- A queda do número de batimentos dez segundos após a finalização do teste indica uma primeira adaptação no referido período de treinamento pois a exigência física para uma mesma atividade (música, velocidade, ritmo, tempo de duração e sequência dos passos básicos da modalidade padronizadas pelo protocolo do IRFC) foi inferior, indicando um menor esforço para a realização do mesmo estímulo físico.
- Como relatado na parte inicial do post, as evidências científicas indicam que uma recuperação mais rápida da frequência cardíaca após um esforço intenso (no caso o teste do IRFC, 3 minutos após o final ) é um bom indicador da evolução da condição física do ginasta quando comparado com ele próprio em momentos distintos no decorrer da planificação.
- Desta maneira a recuperação mais rápida da frequência cardíaca, gerando um maior percentual numérico expresso pela fórmula proposta no IRFC, será um indicador interessante (junto das colocações expostas na conclusão acima) para demonstrar o desempenho do atleta em cada avaliação realizada.
Na minha prática faço uso da estatística apresentada na figura 13, ou seja, o atleta deve apresentar o seu percentual de recuperação da frequência cardíaca na casa dos 30%, valor esse equivalente a media de todos os anos da aplicação do teste e que indica um IRFC satisfatório dentro dos parâmetros do treino.
Essa porcentagem de recuperação (30%) é avaliada como muito boa de acordo com a tabela de classificação apresentada na figura 16.

Como visto, segundo alguns autores, a recuperação da frequência cardíaca parece ter uma relação estreita com a condição aeróbica do indivíduo.
Desta maneira, caso o ginasta se encontre abaixo desse valor de referência (30%),
a indicação será aumentar o volume do treinamento aeróbio, seja através dos tradicionais treinamentos contínuo e/ou intervalado, ou utilizar o conteúdo aeróbico da coreografia competitiva (também de maneira contínua e intervalada) como ferramenta principal do treino.
Resumindo, caso o IRFC se encontre abaixo dos 30% o treinador deverá se preocupar prioritariamente dentro do seu planejamento em otimizar o treinamento aeróbio para um melhor desempenho coreográfico do ginasta.
IRFC UTILIZADO COMO TESTE CONTROLE
Uma outra forma de utilizar o IRFC é com o intuito de avaliar a adaptação dentro de um período mais agudo de treinamento ( 1 a 2 microciclos, por exemplo).
Neste caso, como o teste deverá ser realizado 2 x por semana, é indicado reduzir o tempo de duração da avaliação para 50” para não comprometer a carga de treino semanal aumentando o nível de fadiga além do planejado, será um teste controle.
Quando o IRFC é empregado com esse objetivo não se faz necessário a avaliação do conteúdo técnico do teste, a orientação é para executá-lo com o melhor desempenho possível sendo o foco principal a tomada da frequência cardíaca nos 2 momentos já conhecidos.
A tendência quando realizamos um treinamento planejado de forma mais intensa e com uma maior concentração de cargas é de que o atleta entre em um estado de overreaching funcional, causando desta maneira uma queda momentânea e controlada do desempenho e que resultará posteriormente em uma supercompensação, potencializando o estado de treinamento do ginasta.
Períodos de 2 semanas costumam ser suficientes para uma avaliação mais detalhada dos resultados desse processo.
A seguir será apresentado um relato de 3 ginastas que participavam de um mesmo trio na categoria adulto sendo submetidas, naquele momento, a uma carga de treino mais elevada na planificação.
As atletas A e B já pertenciam a esta categoria alguns anos e a C ainda era uma juvenil subindo para o adulto, ou seja, 2 atletas mais experientes e donas de maior lastro de treinamento com relação a outra ginasta .
A programação era composta de treinos na 2°,3° e 4° feira, descansando na 5° e retornando aos treinamentos na 6°feira e no sábado, voltando a folgar no domingo.
Dentro da proposta buscando um estado de overreaching funcional o planejado era da utilização de treinamentos mais intensos no período de 2 semanas intercalados com uma terceira de recuperação, repetindo esse ciclo por mais 2 vezes consecutivas no decorrer da periodização
As avaliações (teste controle) eram realizadas na quarta e na sexta-feira e os ajustes seriam feitos a partir dos resultados de cada semana.
A ideia foi utilizar o resultado do IRFC da 4° feira como parâmetro de comparação com o da 6°, pois como a quarta-feira era o terceiro dia seguido de treino as atletas tenderiam a apresentar uma fadiga acumulada maior e um menor % de recuperação da frequência cardíaca sendo consequentemente o dia em que se encontrariam mais desgastadas.
Já para a 6° feira era aguardado uma melhor recuperação e portanto um maior IRFC pois vinham do descanso da 5° feira.
Como as ginastas estavam passando por um período de overreaching funcional a primeira sexta-feira (10/junho) serviria como controle para possíveis ajustes na carga de treino.
Através das figuras abaixo (17,18 e 19) é possível analisar as respostas geradas no organismo das ginastas referentes às cargas de treino aplicadas no decorrer dos microciclos.
Vamos agora observar o que ocorreu com cada ginasta do trio...
De acordo com a figura 17, a ginasta A apresentou um desempenho com características de um estado de overreaching na primeira semana, pois na 6° feira (10/junho) seu IRFC foi menor que na 4° feira (8/junho) demonstrando uma recuperação incompleta, indicando um período insuficiente de restauração devido às cargas de treino aplicadas.
Isso, apesar de indicar algo normal em função da intensidade das cargas utilizadas por 3 dias consecutivos, serviu também como parâmetro de comparação para ser analisada junto a outra semana para uma apreciação mais aprimorada com os aspectos relacionados a adaptação ao treinamento planejado.
Conforme demonstrado na figura 17, a resposta da ginasta A na segunda semana foi padrão dentro do objetivo proposto, onde o percentual de recuperação da frequência cardíaca da 6° feira foi maior que o de 4° feira demonstrando uma ótima adaptação com relação as cargas de treino aplicadas no decorrer das 2 semanas.

A figura 18 apresenta os gráficos da atleta B nos quais ficam evidenciados uma excelente adaptação as cargas de treino, com a ginasta apresentando um melhor IRFC nas duas 6° feiras com relação às 4° feiras.
Como a ideia era trabalhar em estado de overreaching as cargas da primeira semana sofreram um ajuste visando um pequeno aumento para ser incorporado na segunda semana, e a alteração se mostrou bastante eficiente.

Interessante notarmos o rendimento da atleta C (figura 19) a qual ainda era juvenil e que consequentemente tinha uma menor reserva de adaptação e menos acostumada e preparada para os treinamentos de maior volume e intensidade da categoria adulto.
Da mesma maneira que a ginasta A ela apresentou um rendimento com particularidades de overreaching na primeira semana, sendo que na 6° feira (10/junho) seu IRFC foi menor que na 4° feira (8/junho) apontando uma recuperação incompleta, significando um período escasso de reparação em função das cargas de treino direcionadas.
O fator que chamou mais a atenção foi referente a segunda semana pois a recuperação da frequência cardíaca foi menor nas 2 sextas em relação as quartas-feiras sendo ainda que o IRFC da sexta 17/junho foi abaixo da sexta-feira 10/junho.
Esse ocorrido evidenciou que a ginasta C provavelmente estava com sua recuperação comprometida em função do treinamento mais volumoso e intenso ao qual estava sendo submetida e através disso sua planilha de treino foi alterada visando uma redução e reajuste em algumas variáveis e a rota corrigida com sucesso.
Caso esses reparos não tivessem sido feitos, os efeitos almejados com relação a resposta do organismo as cargas de treino poderia ter saído do planejado (overreaching funcional) para um não desejado (overreaching não funcional) o que fatalmente causaria sérios problemas no decorrer do processo do treinamento.

A partir de agora então temos 2 ferramentas importantes quando nos referimos a avaliações específicas destinadas à coreografia competitiva, uma validada e publicada, o SAGAT (Teste de Borelli) voltado para o conteúdo anaeróbio e a outra em forma de proposta, o IRFC (Índice de Recuperação da Frequência Cardíaca) direcionado para o quesito aeróbio e também servindo como instrumento de avaliação direcionado para aferir a adaptação dentro de um período mais agudo de treinamento.
Certamente com a utilização desses recursos teremos um melhor controle e resultados mais otimizados do treinamento físico-coreográfico dentro da planificação...Então mãos a obra!!
Parabéns Borelli Gigante!!!
Grande professor Borelli, é sempre bom ver, ler e refletir os seus posts. Sempre aprendemos muito com eles, principalmente quando podemos realizar uma transposição do conhecimento descrito nele. O que quero dizer com isto? Você descreve sobre um fenômeno natural - fadiga central - extremamente relevante para quem atua no desenvolvimento das capacidade físicas, ou seja, no condicionamento cardiovascular. Por meio de um indicador IRFC (Índice de Recuperação da Frequência Cardíaca) simples, porém com respeito as regras em torno dele - método desenvolvido e observado na empiria, há possibilidades de verificar como o sistema central se encontra referente as cargas de treino. Logo, há condições de revelar, a partir deste índice, se o que foi idealizado pelo profissional de Educação…